Juliano Moreira

Mestiço, filho de uma mulher negra e um homem branco, Juliano Moreira nasceu na cidade de Salvador (BA), em 1872. Sua mãe, Galdina Joaquina do Amaral, era empregada doméstica, e seu pai, o português Manuel do Carmo Moreira Junior, trabalhava como inspetor de iluminação pública. Juliano era, portanto...

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書誌詳細
フォーマット: Online
出版事項: 2021
オンライン・アクセス:https://canalciencia.ibict.br/historia-das-ciencias/cientista?item_id=22916
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要約:Mestiço, filho de uma mulher negra e um homem branco, Juliano Moreira nasceu na cidade de Salvador (BA), em 1872. Sua mãe, Galdina Joaquina do Amaral, era empregada doméstica, e seu pai, o português Manuel do Carmo Moreira Junior, trabalhava como inspetor de iluminação pública. Juliano era, portanto, de origem humilde e só foi oficialmente reconhecido por seu pai depois que este tornou-se viúvo. Foi batizado por Luís Adriano Alves de Lima Gordilho, médico e patrão da mãe de Juliano. Gordilho era mais conhecido como Barão de Itapoã e foi Lente Catedrático de Anatomia Descritiva e da Cadeira de Partos da Faculdade de Medicina da Bahia (FMB). O Barão financiou os estudos de seu afilhado, que, depois de cursar a escola preparatória, foi aprovado nos exames de admissão para o ensino superior. Em 1886, com 14 anos de idade, Juliano Moreira ingressou na Faculdade de Medicina da Bahia. Em 1891, formou-se defendendo a tese de doutoramento intitulada “Etiologia da sífilis maligna precoce”. Nela, Moreira dizia que o clima quente e úmido em nada contribuía para que a doença assumisse formas mais severas nas regiões tropicais do planeta, como defendiam certos médicos, especialmente os europeus. Depois de formado, Juliano Moreira atuou como Médico Sanitarista Comissionado, trabalhando nas cidades de Bonfim, Jacobina e cercanias. Em 1893, assumiu o cargo não remunerado de Assistente da Cadeira de Clínica Psiquiátrica da faculdade onde se formou, passando a trabalhar no asilo de alienados da Santa Casa de Misericórdia de Salvador. No ano seguinte, assumiu o cargo remunerado de Preparador de Anatomia Cirúrgica, o qual lhe possibilitou continuar os estudos sobre sífilis e iniciar investigações sobre a anatomia e patologia de outras doenças. Em 1896, Juliano foi aprovado no concurso para Lente Substituto da Cadeira de Psiquiatria e Neurologia da FMB. A partir do final do século XIX, o médico baiano fez diversas viagens à Europa, onde teve contato com cientistas de renome, como o dermatologista Paul Unna. No laboratório chefiado por Unna (Hamburgo, Alemanha), Moreira desenvolveu estudos sobre uma doença chamada Ainhum (que acometia, sobretudo, pessoas negras), e que foram publicados na revista alemã Monatsheft für Dermatologie (1900). Ainda em terras germânicas, o cientista brasileiro visitou a Clínica Psiquiátrica da Universidade de Leipzig, dirigida por Paul Emil Flechsig. Lá teve a oportunidade de discutir teorias sobre as doenças mentais com o renomado professor Johann Christian Heinroth. Na mesma ocasião, visitou a Clínica Psiquiátrica da Universidade de Halle, sob direção de Julius Edward Hitzig. Nos anos que se seguiram, Moreira fez outras viagens à Europa, visitando instituições de cuidados com alienados em países como: Itália, Inglaterra, Escócia e Bélgica. Participou de inúmeros congressos internacionais, nos quais apresentou suas ideias sobre as enfermidades psíquicas e divulgou a ciência brasileira. Publicou seus estudos em periódicos médicos franceses, alemães e britânicos. Esteve na Clínica Psiquiátrica da Universidade de Munique, dirigida pelo psiquiatra Emil Kraepelin, considerado hoje “pai” da psiquiatria moderna. Em Munique, teve contato com outros importantes cientistas, a exemplo de Alois Alzheimer, que desenvolveu estudos de impacto no campo da anatomopatologia nervosa, e Felix Plaut, um dos precursores dos estudos sorológicos da sífilis nervosa. As experiências de Juliano Moreira na Europa, de um modo geral, e especificamente na Alemanha, trouxeram contribuições importantes para as reformas que viria a empreender mais tarde, enquanto diretor da maior instituição de cuidados para alienados do Brasil, o Hospital Nacional, e da Assistência Médico-Legal de Alienados. Em 1903, Moreira deixou Salvador rumo ao Rio de Janeiro, então Capital da República, para assumir o cargo de Diretor do Hospital Nacional de Alienados. Junto ao poder público, a intelectuais e outros cientistas que compartilhavam ideias similares às dele, Moreira empreendeu uma série de reformas físicas e burocráticas no hospital e na assistência. Durante sua gestão, foram criados novos pavilhões para que os pacientes fossem realocados em espaços diferentes, e distribuídos de acordo com os critérios de idade, sexo e com a gravidade da doença. Além disso, foram realizadas melhorias no laboratório anatomopatológico e no necrotério - ao longo de sua carreira Juliano Moreira falou bastante sobre a importância dos laboratórios nos hospitais, inclusive nos psiquiátricos. Moreira esteve envolvido na criação do primeiro periódico nacional dedicado ao estudo das enfermidades psíquicas, denominado Arquivos Brasileiros de Psiquiatria, Neurologia e Ciências Afins (1905) e na fundação da Sociedade Brasileira de Neurologia, Psiquiatria e Medicina Legal (1907). Fez parte da comissão de médicos que desenvolveu a primeira Classificação Brasileira de Doenças Mentais, publicada em 1910. Foi membro de inúmeras sociedades, ligas e associações nacionais e estrangeiras, e construiu redes de sociabilidade internacionais nas quais adquiriu muito prestígio. Em 1925, na ocasião da visita do físico alemão Albert Einstein ao Brasil, Moreira discursou sobre a influência da Teoria da Relatividade em outras áreas do conhecimento, na Academia Brasileira de Ciências, da qual foi um dos fundadores e onde exerceu os cargos de Presidente, Vice-Presidente e Membro Titular. Einstein foi convidado por Moreira e pela esposa alemã, Augusta Emma Moreira, para um “almoço brasileiro com muita pimenta”, nas palavras do próprio físico, que ficou admirado com a “pessoa especialmente virtuosa” de Juliano. Moreira foi um grande intérprete do Brasil, colocando-se contra certas teorias raciais deterministas, defendidas por muitos médicos da época, e buscando refletir sobre a relação entre loucura e educação. Para ele, a cor da pele de um indivíduo não influenciava o adoecimento pela loucura, mas sim a capacidade de manter-se longe de elementos considerados nocivos à época, tais como: o abuso do álcool, os excessos de trabalho físico e intelectual e a sífilis. No discurso de posse como Lente Substituto da Cadeira de Psiquiatria da FMB, o médico e negro de fala rebuscada comparou a diversidade racial do Brasil a pedras preciosas de diferentes cores e, com essa metáfora, pretendeu dar uma resposta à altura dos episódios de racismos que softeu naquela instituição.